25 de dezembro de 2025
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Intervenções na logística internacional são um caminho para conter o avanço do lixo plástico em países mais vulneráveis

O plástico cresceu mais rápido que qualquer outro material industrial nos últimos 65 anos. Sua durabilidade barata, inicialmente uma inovação, virou um problema ambiental e de saúde pública de proporções globais. Sem estratégia de fim de vida, o mundo faz um experimento sem controle, com plástico acumulando-se em países pobres, rios, e no Oceano todo.

O plástico não se fabrica em um bairro. Muitas vezes, nem dentro de um único país. Ele depende de uma cadeia internacional gigantesca. Os chamados plásticos primários —produtos químicos líquidos ou gasosos utilizados para fazer produtos plásticos— atravessam oceanos para abastecer fábricas pelo mundo.

Desde os anos 1950, quando os primeiros plásticos surgiram, a complexidade e dimensão dessa cadeia só cresceu. Hoje, o plástico é uma commodity global, tão presente que quase tudo à nossa volta contém algum pedaço dele. Olhe a sua volta: é possível visualizar porque a demanda mundial por plásticos mais que triplicou entre 1991 e 2021.

Um crescimento tão grande de moléculas sintetizadas em laboratório – que não existem na natureza – certamente traria desafios. Entre eles, o desafio da contaminação dos nossos próprios corpos e ecossistemas.

Em locais com regulações e/ou capacidades institucionais mais fracas – especialmente em países do Sul Global – esses desafios se transformam em crises visíveis: plásticos no solo, na água, nas ruas, nos peixes, no leite materno.

Avaliações tecnológicas e análises de ciclo de vida mostram que, a todo e qualquer custo, ainda não dispomos de um sistema de gestão de resíduos realmente eficiente quando o assunto é plástico —não na escala em que o temos produzido, consumido e descartado; nem mesmo considerando cenários amplos de reciclagem e incineração.

As veias abertas do plástico

O comércio internacional teve (e tem) papel central na cadeia de valor do plástico em todo o mundo. A própria indústria do plástico reflete essa complexidade e escala: empresas líderes do setor muitas vezes não possuem fábricas próprias —elas dependem de amplas redes de fabricantes terceirizados, geralmente localizados em países com mão de obra mais barata. O resultado é uma cadeia longa, complexa e difícil de rastrear. Por décadas, o comércio internacional e o lobby do petróleo sustentaram a dependência econômica de 140 plásticos-commodities.

Considerando a alta ramificação dessa cadeia, um estudo brasileiro elaborado por nós, autores deste artigo, começou a destacar o papel de alguns portos —territórios restritos e delimitados do comércio internacional— nessa cadeia.

Muitas cadeias de valor globais — não só a do plástico — passam por poucos portos espalhados pelo mundo. Isso significa que uma grande parte do poder e do controle dessas cadeias está concentrada em poucas empresas portuárias nessas passagens fronteiriças.

Mesmo quando essas empresas assumem alguma responsabilidade socioambiental, elas raramente cobrem toda a extensão e a complexidade dos impactos gerados. Afinal, as cadeias entram e saem pelos portos, mas se espalham pelo mundo.

Na maioria dos casos, são multinacionais sem qualquer vínculo comercial com os produtores e consumidores da parte doméstica da cadeia do plástico. O estudo propõe investigar quais portos, ao funcionarem como funis dessa cadeia, são pontos estratégicos para a implementação de políticas públicas para iniciar o gerenciamento dessa crise.

Por isso, pensar na redução gradual —e realmente intencional— da cadeia do plástico como política ambiental é também pensar em políticas de planejamento econômico que incidam sobre fluxos de sua cadeia de valor.

É uma orquestração necessária (o planejamento de políticas ambientais junto às macroeconômicas) e em uma escala necessária (internacional), às políticas que visem buscar com seriedade, nos dados, soluções para as crises climática e do plástico.

O crescimento prejudicial da produção de plástico não aconteceu sozinho. Ele teve —e segue tendo— acordos comerciais favoráveis e incentivos de governos de todo o mundo.

Por ser um produto refinado do petróleo, as cadeias de suprimento do plástico confluem no seu início para a extração de petróleo. Ou seja, o lobby do petróleo, com suas atividades fortemente subsidiadas, também desestimula o desenvolvimento de produtos e modelos de negócio mais circulares.

Redirecionar esses incentivos poderia mudar o jogo

Investimentos em inovação e transferência de tecnologia para materiais alternativos, substitutos, compostáveis e biodegradáveis, em sistemas varejistas baseados em reuso das embalagens, podem guiar economias para a saída dessa crise. Junto a tarifas sobre produtos descartáveis ou não recicláveis, e taxas sobre aterros e incineração, intervir no “meio da cadeia” — o midstream — é um ponto de virada que vem sendo esquecido, e é onde políticas podem agir muito antes que o plástico chegue ao consumidor.

Diante da urgência, mas também diante da complexidade da crise plástica, a questão não dá pra ser participar ou não do comércio global da cadeia do petróleo. Não conseguimos deixar de comprar plástico nas nossas escolhas diárias. A questão na escala coletiva é como participar de uma transição para novas cadeias de substitutos do plástico, que também promovam menor disparidade entre economias.

No estudo desse como, chamamos para a mesa as agências portuárias. Para que, antes de chegarmos à fixação de metas operacionais mais refinadas, possamos trabalhar com algo aplicável e testável hoje nos principais portos da cadeia.

midstream dos portos é estratégico: é territorialmente limitado, informatizado e monitorado. Por que não começar por eles então?

Começando pelos portos do Sul

Para minimamente planejar uma saída da dependência do plástico, no entanto, a visão de duas dimensões são essenciais — tanto para evitar uma abordagem simplista e que desconsidere históricas assimetrias de poder em curso.

Primeiro, a visão estratégica. Alguns portos, muitas vezes, influenciam economias de regiões e países inteiros. E, portanto, também são atores-chaves para políticas ambientais. Com essa visão, as agências portuárias assumem o papel de parceiras estratégicas para intervenções em determinadas cadeias e determinadas regiões.

Hoje falamos muito de soluções no começo da cadeia (upstream) ou no fim (downstream). Mas pouco sobre o meio —o midstream— onde decisões realmente podem ter impacto. A dimensão estratégica coloca a territorialização da política no centro da análise, e se baseia antes nos dados dos volumes e valores movimentados, do que em bandeiras de amplos ou desconexos territórios nacionais.

Segundo, a visão de justiça. Justiça, seja distributiva, ambiental, ou climática, tem uma direção comum: a para o mais pobre, vulnerável, e exposto a risco. A mera tarifação de certos plásticos em portos do Norte simplesmente reduzirá mais o poder de compra e de acesso a serviços no Sul e, portanto, da qualidade de vida dessa população de forma generalizada.

Nesse sentido, políticas ambientais atuando sobre cadeias de valor devem destacar múltiplas formas de intervenção possíveis e direcionadas a economias diversas, tomando a dicotomia Norte e Sul apenas como um pano de fundo histórico a ser considerado, mas não generalizável.

Outros resultados iniciais da pesquisa no Porto de Santos destrincham esses fluxos totais nos códigos de cargas mais representativos e estratégicos, também considerando os processos químicos envolvidos na fabricação dos diferentes tipos de plásticos e conexões com outros setores.

Mais que apresentar uma seleção padronizada para todas as economias dentre os 140 tipos de insumos da cadeia do plástico e os plásticos em si, a evidência científica provoca a discussão política sobre metas de redução gradual a esses plásticos-commodities, cujos dados são facilmente acessíveis no portal ‘World Integrated Trade Solution’, que opera com dados do UNCOMTRADE – United Nations Commodity Trade Statistics Database.

Dados sobre como os plásticos são comercializados internacionalmente sob 140 nomes diferentes (incluindo como resíduo) estão na seção 39, para todos os países. A complexidade dessa análise é um desafio imenso. No entanto, apresentar um pacote inicial de indicadores do comércio internacional no timing das negociações do GPT também é uma estratégia de diplomacia científica. E visibilizar esse midstream da cadeia ajuda a tirar o foco corrente na culpabilização do consumidor final, ou da ineficiência dos sistemas de coleta e separação e reciclagem.

Sem perder de vista essas duas dimensões —a estratégica e a em favor da justiça— a experimentação coordenada dessa tarifação de transição pode (e deve) começar.

O rápido e volumoso aporte de recursos provenientes dela, aplicada em portos selecionados pelo mundo todo, pode abastecer fundos específicos destinados ao financiamento de inovação para: novos sistemas distributivos com menos descarte e mais reuso; desenvolvimento de materiais substitutos no setor de embalagem; ou ainda ao financiamento da recuperação de zonas de sacrifício já cobertas de plástico ou emitindo dioxinas e furanos.

Plásticos nascem do petróleo, um lobby poderoso que bloqueia mudanças. O “ato final” do lobby do petróleo só acontecerá com políticas internacionais fortes. A pesquisa brasileira, iniciada no Porto de Santos, mostra um caminho em caráter experimental: começar pelos portos —poucos, centrais e poderosos. Podem ser eles os pontos de virada de algumas de nossas crises tecnológicas.


Este texto foi republicado de The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o texto original aqui.



Autor Poder360 ·


Água está imprópria para uso em 207 dos 576 quilômetros analisados; Dia do Rio Tietê é comemorado desde 1992

Às vésperas do Dia do Rio Tietê, celebrado no domingo (22.set.2024), o programa de monitoramento da Fundação SOS Mata Atlântica mostrou que houve uma piora na poluição do rio em 2024. Segundo o programa Observando os Rios, a água está imprópria para uso em 207 dos 576 km analisados. Representa um crescimento de 29% em relação ao ano anterior, quando a mancha de água imprópria para usos cobria 160 quilômetros. Dos 207 km de mancha, 131 km estavam com qualidade ruim e 76 km, péssima.

Este é o 4º ano seguido em que a área poluída cresce. “A mancha é um termo que demos como sendo essa porção do rio que está sem oxigênio, que está concentrando tantos poluentes que as bactérias aeróbicas deixam de trabalhar e, as anaeróbicas, entram em funcionamento, fazendo com que o rio tenha aspecto escuro, mau cheiro e baixa diversidade biológica, sem peixes, aves ou moluscos”, explica Cesar Pegoraro, educador e mobilizador da Causa Água Limpa.

“O rio está sempre nos mostrando o que a sociedade está fazendo com ele. Nesse sentido, a mancha está mostrando para a gente que tem políticas públicas que precisam ganhar força. Cidadãos e cidadãs precisam se engajar mais com a questão do saneamento básico, cuidar mais da rua e da poluição difusa”, diz.

Segundo Gustavo Veronesi, coordenador da Causa Água Limpa da SOS Mata Atlântica, uma das explicações para o aumento da mancha de poluição no Tietê são as emergências climáticas. “O principal fator desse aumento da mancha de poluição se deve às emergências climáticas. Na região metropolitana tem chovido bem menos então o esgoto, que ainda cai no rio, tem menos água para diluir, devido a esse processo de seca”, explica.

Além dos fatores climáticos, o especialista aponta a falta de saneamento básico como outra causa do aumento da área poluída. “Muita gente ainda não tem o acesso básico ao serviço de tratamento e coleta de esgoto. Então, muito esgoto ainda cai no rio”, alerta Veronesi.

HISTÓRICO

Maior rio do Estado de São Paulo, com 1.136 quilômetros da nascente à foz, o Tietê corta o Estado de leste a oeste, banhando 62 municípios paulistas. Entre esses municípios, a capital São Paulo.

A data em celebração ao rio surgiu em 1992, durante a ECO-92, realizada no Rio de Janeiro. Durante o evento, um abaixo-assinado com mais de 1,2 milhão de assinaturas foi entregue ao então governador de São Paulo, Luiz Antônio Fleury Filho, exigindo a despoluição.

A partir daí, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) iniciou o Projeto Tietê para despoluição do rio e, a SOS Mata Atlântica criou um programa de monitoramento da qualidade de água, chamado Observando o Tietê, que se transformou no Observando os Rios.

“Ter uma data em celebração ao rio é uma forma de resistência”, destaca Cesar Pegoraro, “Essa é uma forma de mostrar que esse rio está vivo, que esse rio é uma água necessária e útil para a vida da nossa cidade e que ele é um espaço de lazer, de contemplação e de esportes”, afirma.

Desde quando passou a ser monitorada, essa extensão da mancha de poluição teve variações, alternando momentos de redução e de aumento. Desde 2021, no entanto, ela cresceu 143,5%, passando de 85 para 207 quilômetros.

“A mancha de poluição é uma forma didática que a SOS Mata Atlântica encontrou para mostrar para a sociedade como está a evolução do projeto de despoluição do Tietê. Essa mancha vinha numa decrescente contínua até a época da crise hídrica, em 2014, quando, por redirecionamento dos investimentos para captação de água para a população, o tratamento do esgoto ficou para segundo plano. Isso estava se recuperando mas, com a pandemia, voltou a crescer”, explica Veronesi.

Quando essa mancha de poluição cresce, isso significa que o rio não tem possibilidade de uso para lazer, turismo, pesca ou para irrigação.

“Para mudar essa situação, a gente precisa da continuidade do projeto de despoluição do Tietê, uma celeridade nas obras de coleta e tratamento de esgoto, mas também usar soluções baseadas na natureza. Em lugares mais distantes, em comunidades isoladas ou rurais, é muito possível se pensar em soluções baseadas na natureza que podem ser um biodigestor, um ciclo de bananeiras, uma ilha ou um jardim filtrante”, exemplifica o coordenador. “Também colocamos como muito importante o estabelecimento de um parque linear que ligue o Rio Pinheiros ao Rio Tietê, fazendo um grande corredor ligando a Represa de Guarapiranga até o Parque Ecológico do Tietê”, acrescenta.

BOA QUALIDADE

A qualidade da água do Rio Tietê foi monitorada num total de 576 quilômetros, desde a nascente, em Salesópolis, até Barra Bonita, na hidrovia Tietê-Paraná. Nesse trecho, foi encontrada água de boa qualidade ao longo de 60 quilômetros, entre a nascente e a cidade de Mogi das Cruzes, e também em outra faixa de 59 quilômetros, que se estende da região do Reservatório de Barra Bonita, entre São Manoel e a foz do Rio Piracicaba. Nenhum trecho do rio, no entanto, foi qualificado como ótimo.

Houve também uma faixa de 250 quilômetros de extensão em que a condição da água estava regular, observada em três segmentos ao longo do médio Tietê.

INTEGRA TIETÊ

Em março do ano passado, o governo de São Paulo lançou o Programa IntegraTietê para promover a revitalização do principal rio paulista. Segundo o governo, o programa estabelece uma série de medidas de curto, médio e longo prazo. A estimativa atual é que, até 2026, sejam investidos R$ 15,3 bilhões, totalizando, até 2029, mais de R$ 23,5 bilhões, na expansão e melhorias do sistema de saneamento básico, desassoreamento, gestão de pôlderes, melhorias no monitoramento da qualidade da água e recuperação de fauna e flora, entre outras medidas.

Apesar de programas como esse, a SOS Mata Atlântica afirma que a qualidade da água continua a ser comprometida por condições locais, como poluição por esgoto, gestão de reservatórios e operação de barragens, clima ou resultante de atividades agropecuárias.

Por isso, Veronesi reforça a necessidade de ter planos integrados para despoluir o rio e que considerem os impactos das mudanças climáticas, do saneamento ambiental nas cidades e do uso da terra nas áreas rurais. “Poluir um rio é rápido, mas a recuperação é lenta e exige um estado de atenção constante, com melhorias contínuas nas estruturas de saneamento e na educação ambiental para evitar sua degradação”, diz.

Embora seja um processo lento, Veronesi aponta que a despoluição é possível. “Todos os rios podem ser despoluídos sim. Mas isso depende de um esforço de toda a sociedade, começando pelo poder público, mas também unindo empresários, agricultores, comerciantes e cidadãos”, destaca.


Com informações da Agência Brasil.



Autor Poder360 ·